Cena Três
Abre-se a porta do lado direito do palco e acende-se uma luz fraca, preferencialmente alaranjada. Luísa entra em casa, com sacas plásticas de um supermercado, visivelmente cansada. Carlos está no sofá a ler o jornal, bem vestido, com ar de empresário.
Luisa: Ah, bom, já chegaste!
Carlos (lendo o jornal): Hum hum.
Luísa: Há quanto tempo?
Carlos (virando lentamente a página do jornal): Há algum… hum, tempo.
Luísa: Hum. Tens fome?
Carlos: Comi no escritório.
Luísa: Salada?
Carlos: Não, minha querida, liguei ao restaurante que fica por debaixo dos escritórios e pedi comida.
Luísa: E pediste o quê, então?
Carlos continua em silêncio a ler o jornal, completamente abstraído.
Luísa: Carlos? Carlos!
Carlos: Sim, querida? Disseste alguma coisa?
Luísa: Não. Não.
Carlos: Bom, quando fizeres o jantar chama por mim, então.
Luísa: Mas…?
Luz.
Cena Quatro
Luísa e Carlos estão ambos sentados à mesa de jantar. Um silêncio constrangedor paira no ar, ouvem-se o som dos talheres e o folhear de um livro e de uma revista que Carlos e Luísa lêem, respectivamente.
Luísa ri-se, olha para Carlos, mas este continua impávido e sereno. Luísa levanta-se e arruma a mesa, enquanto Carlos permanece abstraído.
Luísa ri-se, olha para Carlos, mas este continua impávido e sereno. Luísa levanta-se e arruma a mesa, enquanto Carlos permanece abstraído.
Luísa: Amanhã vou fazer uma entrevista a uma possível candidata para o lugar de minha assistente.
Carlos (continua a ler o livro): Que bom, querida.
Luísa (suspirando): Carlos…
Carlos: Sim, querida?
Luísa: Carlos, já pensaste que nos podíamos divorciar e ir viver um para cada lado? Podíamos recomeçar as nossas vidas do zero, estas vidas que cada vez mais se assemelham a um buraco negro. Estou cansada dessa tua ausência permanente, Carlos, como marido devias estar presente em todos os momentos da minha vida. Como já o fizeste! O que é que aconteceu connosco? Como é que nos perdemos um do outro? Nós que juramos amor eterno perante todos aqueles olhares que nos condenavam por casarmos tão cedo.
Carlos: Hum hum, sim querida. Olha, acho que me vou deitar, está bem?
Levanta-se e sai de cena. Luísa permanece em cena com um olhar preso no infinito. Suspira.
Luísa: E se amanhã a rapariga que eu vou conhecer for uma assassina e me mata na primeira oportunidade, será que ele nota? O mais certo é chegar a casa, pisar o meu cadáver e gritar 'Luísa! Há algo no chão, vê se limpas isso!' E nós que sempre dissemos que iríamos ser felizes para sempre. Pelos vistos quem apontou a morte do nosso casamento deve estar, neste momento, a dançar de felicidade.
Mas não, Luísa, não ajas de cabeça quente. Se ele já foi um homem apaixonado, pode voltar a sê-lo mais cedo, ou mais tarde. As mulheres são pacientes. E tu és uma mulher. Paciente.
Luz.
Sem comentários:
Enviar um comentário