26 de abril de 2011

ACTO II

Cena Cinco
Luísa e Francisca devem levantar-se do chão ao mesmo tempo. Luísa veste-se e compõe-se. Francisca deve imitar os mesmos movimentos. Devem estar viradas uma para outra, como se olhassem para um espelho. O telemóvel de Francisca toca. Enquanto ela se levanta para o ir buscar, Luísa deve, lentamente, colocar-se em posição fetal.

Francisca: Estou? Carlos? Sim, sim estou em casa, mas passa-se algo com a Luísa? Traz-me uns textos? Sim, sim, pode trazê-los cá. (pausa) Sim, sim, é essa a morada, sim.
Luz.
Após o palco ficar em plena escuridão, devem ligar-se pequenos focos: um em Luísa (ainda em posição fetal) e outro em Francisca (que deverá estar em pé, a olhar o público)
Francisca: Confesso-vos: há muito tempo que já só via o Tomé como um amigo. Bom, nem é assim há tanto tempo, mas desde que conheci o Carlos. Desde que ele me tocou e eu senti aquelas borboletas na barriga. E foi aquele toque, tão simples, que libertou tudo isto em mim. Mas, mas depois lembro-me da Luísa e de como lhe devia ser fiel. Porque ela abriu-me uma porta para o seu mundo interior, mostrar-me os seus textos? É dar a chave e a porta para entrar na sua mente. Ainda não sei o que a faz ser uma escritora fenomenal. Incrivelmente, quando a leio, também sinto…. Também sinto borboletas na barriga.
As campainhas tocam. Francisca estremece. Luísa levanta-se num pulo. Correm ambas para a entrada. Respiram e abrem a porta. Toda a acção seguinte deve acontecer ao mesmo tempo nos dois cenários:
Francisca: Carlos!
Luísa: Sim?
Carlos: Posso?
Francisca: Claro, claro.
Tomé: Surpreendida por me ver, Luísa?
Luísa: Sim, por completo, tendo em conta que nem sei quem é. Como sabe o meu nome?
Tomé: Sou o Tomé, EX - namorado da Francisca. Ela falou-me muito de si.
Francisca: Não trazia uns textos para mim?
Luísa: Da Francisca? (pausa) Traz textos para mim? (pausa) Ex, ex-namorado, foi o que disse?
Carlos: Perdoe-me Francisca, mas isso foi apenas uma desculpa que usei para a ver. É que eu, bom, sabe, eu não deixei de pensar em si desde que tivemos aquele momento.
Tomé: Perdoe-me Luísa, mas isso foi apenas uma desculpa que usei para a ver. É que eu, bom, sabe, eu não deixei de pensar em sim desde que a Francisca me falou de como era bela.
Francisca e Carlos olham-se e quando Carlos a tenta beijar, Francisca afasta-se. O mesmo acontece com Luísa e Tomé.

[cont.]

19 de abril de 2011

ACTO II

Cena Quatro

[cont.]

Tomé deixa o apartamento. Deverá levar alguma coisa consigo como malas ou uma mochila. Francisca fica em pé encarando o público enquanto Tomé se demora a olhá-la na porta. No outro lado, Carlos e Luísa estão estáticos, encarando-se. Lentamente, assim que Francisca iniciar a sua fala, Luísa deverá começar a despir-se, insinuando-se no corpo de Carlos.
Francisca: Nua, dispo-me de ti. Sem qualquer tabu, pudor ou preconceito. Lentamente… Lentamente o teu cheiro larga a minha pele e a saudade enche o meu peito. (Francisca deve também começar a tocar-se pelo seu corpo, como se se estivesse a conhecer pela primeira vez, sempre encarando o público) De regras fui feita. Em sonhos construí uma vida. Eu acreditei em ti, minha alma perdida. Eu (pausa) acreditei (pausa) em ti (pausa prolongada). Minha alma perdida.
Assim que Francisca pronunciar as últimas palavras, Carlos deverá colocar Luísa, estrondosamente, em cima da mesa do cenário. Entre eles deve iniciar-se uma espécie de dança corporal que incita ao sexo. Deve ouvir-se uma música. Enquanto a música toca, Francisca deve continuar a tocar-se e assim que se deitar no chão deve colocar as mãos sob o sexo. A luz dever-se-á apagar no cenário de Francisca.
A música pára abruptamente. Carlos e Luísa entreolham-se e continuam a beijar-se.Carlos segura Luísa no colo e suspira-lhe o nome. Luísa beija-o ternamente no pescoço e aproximando-se para o beijar, sussurra:
Luísa: Francisca…

Carlos larga Luísa que deverá cair abruptamente no chão, sentindo-se humilhada. Carlos fixa-a e cospe para o chão. Apanha as suas roupas e sai.


Luz.

12 de abril de 2011

ACTO II

Cena Quatro

Quando a luz se vai ligando lentamente, Francisca e Tomé e  Luísa e Carlos, estão nos seus cenários respectivos. Tomé e Francisca sentados no sofá, Luísa e Carlos à mesa. Todos estão com o seu rosto compenetrado como se o ambiente fosse tenso e de cortar à faca.

Francisca: Bom.. (pausa)
Carlos: Bom… (pausa.)
Tomé e Luísa (em uníssono): Nesta situação não podemos ficar mais. Quero viver, quero sentir o sangue a fervilhar-me nas veias. Quero sentir-me…jovem.
Francisca: Tu tens 25 anos, Tomé. Desde que te conheço que me falas em criar uma família, em vivermos juntos, que era isto que tu querias da vida. Uma família.
Carlos: Pensava que querias uma família, Luísa.
Luísa e Tomé (em uníssono): Isto. ISTO. (batem com o punho na mesa) não é o raio de uma família. Não a família que imaginei.
Francisca e Carlos (pausa prolongada através de um suspiro longo): Não consigo perceber. NISTO, como tu dizes, eu é que podia ter razão de queixa. Tu, tu ignoras-me, brincas comigo como se um trapo eu fosse, tratas-me como produto garantido. E eu, eu deixo-me passar por burra(o) e jogo contigo esse teu jogo de sentimentos do qual as regras não me mostraste.
Francisca e Tomé olham-se longamente. Luísa e Carlos viram as costas um para o outro.
Francisca: Tomé. (continuam a olhar-se) Tu estás apaixonado por alguém?
Tomé: Tu és a menina dos meus olhos, mas eu quero ver o mundo.
Francisca e Luísa: Eu devia ser o teu mundo.
Tomé e Carlos: Mas não és a minha vida.

[continua]

5 de abril de 2011

ACTO II

Cena Três

Francisca está no seu apartamento, sentada, a olhar para o vazio. Suspira de vez em quando, assobia, mexe-se como se sentisse desconfortável. Mexe no cabelo, anda pelo cenário, até que se deita no sofá. Olha constantemente para o telemóvel.
Para o público:
Francisca: Eu gosto muito dele, a sério. Quer dizer… Se eu não gostasse tanto dele, aguentaria eu esta espera louca que ele provoca? Este não responder a mensagens ou a chamadas apenas para dizer que está vivo? Não, ele não está com outra mulher. (pausa) Não está, e eu sei, porque o Tomé sempre prezou a fidelidade. Eu nunca o traí. Nunca. (pausa longa.) Mas quando o Carlos me segurou na mão como um verdadeiro cavalheiro tenho de vos confessar que um ligeiro arrepio me arrefeceu o corpo todo. Tenho de confessar que, por momentos, não sei… O Tomé, eu… Eu sei que não consigo viver sem ele, mas também sei que sinto isto porque de certa forma estou como que viciada nele. No seu cabelo, no seu corpo, no seu cheiro. Mas sinto que ele não pensa o mesmo e que me toma como garantida.
Tomé entra.
Tomé: Francisca, eu… eu…
Francisca roda lentamente sobre si, atónita.
Tomé: Francisca, eu não consigo mais. Eu vou sair de casa.
 Francisca e Tomé olham intensamente um para o outro, correm e abraçam-se. Beijam-se até que a luz se apague.

Luz.